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Estratégia 2018-2022

O conceito de ED tem sido marcado pela evolução e a articulação entre diferentes práticas, teorias e abordagens nos campos do Desenvolvimento, da Cooperação para o Desenvolvimento e da Educação. Se, até à década de 1960, as práticas dominantes se caracterizavam sobretudo pela sensibilização sobre as situações de emergência e subdesenvolvimento e pela divulgação de informação sobre projetos de ajuda internacional fundamentalmente assistencialistas e com vista à recolha de fundos, a partir da década de 1970 consolidou  se uma conceção de ED centrada no pensamento crítico e na compreensão das causas e dos mecanismos de reprodução das desigualdades sociais e cujos objetivos últimos seriam indissociáveis de processos de emancipação social.

Nas décadas seguintes assiste-se, por um lado, a uma evolução das práticas e dos conceitos de ED, acompanhando as transformações nas conceções de desenvolvimento - uma visão economicista do desenvolvimento foi sendo complementada ou ultrapassada por perspetivas mais centradas nas pessoas e no ambiente - , e, por outro, verifica-se uma articulação crescente com outras abordagens educativas - como a Educação para a Paz, a Educação para os Direitos Humanos, a Educação para a Igualdade de Género, a Educação Intercultural ou a ED Sustentável, com os seus pilares ambiental, económico e social, resultante da incorporação de preocupações transversais às políticas e processos educativos, visando um mundo mais justo e solidário.

Estando a génese da ED e a sua evolução profundamente interligadas com as práticas das OSC que atuam no campo da cooperação e da solidariedade internacionais, tem-se verificado também uma crescente participação de outros atores sociais e políticos na sua promoção e implementação. Esta diversidade de práticas e de perspetivas tem-se refletido na complexidade e riqueza conceptual e metodológica no campo da ED, bem como no alargamento dos públicos, num contexto caracterizado pela convivência de abordagens plurais à Educação paraa Cidadania. A multiplicidade de abordagens e de contextos de ação e a própria natureza reflexiva dos processos educativos em causa refletem-se na pluralidade de definições de ED.

Embora tomando nota da evolução da discussão conceptual em torno da ED, a presente Estratégia considera como pontos de partida as definições avançadas pelo Consenso Europeu sobre ED (2007), pelo documento «Uma Visão Estratégica para a Cooperação Portuguesa» (2005) e reiterada pelo «Conceito Estratégico para a Cooperação Portuguesa» (2014), e pela Plataforma Portuguesa das ONGD (2002/2017), mantendo as mesmas fontes de referência mencionadas na ENED 2010-2016.

Definição da Plataforma Portuguesa das Organizações Não Governamentais para o Desenvolvimento (2002):
A ED é um processo dinâmico, interativo e participativo que visa: a formação integral das pessoas; a consciencialização e compreensão das causas dos problemas de desenvolvimento e das desigualdades locais e globais num contexto de interdependência; a vivência da interculturalidade; o compromisso para a ação transformadora alicerçada na justiça, equidade e solidariedade; a promoção do direito e do dever de todas as pessoas, e de todos os povos, participarem e contribuírem para um desenvolvimento integral e sustentável [...] A singularidade da Educação para o Desenvolvimento é a sua vinculação ao Sul e, por isso, o que a distingue de outras “Educações para...” é o ter sempre em conta os discursos e as propostas que são feitos sobre e pelo Sul.

Definição da «Visão Estratégica» (2005):
A ED constitui um processo educativo constante quefavorece as inter-relações sociais, culturais, políticas e económicas entre o Norte e o Sul, e que promove valores e atitudes de solidariedade e justiça que devem caracterizar uma cidadania global responsável. Consiste, em si mesma, num processo ativo de aprendizagem que pretende sensibilizar e mobilizar a sociedade para as prioridades do desenvolvimento humano sustentável. Trata -se de um instrumento fundamental para a criação de uma base de entendimento e de apoio junto da opinião pública mundial, e também da portuguesa, para as questões da cooperaçãopara o desenvolvimento. [...] Por outro lado, as temáticas de ED não se confinam só a matérias de carácter internacional, antes potenciam soluções e respostas para questões transversais da nossa sociedade, como sejam a do respeito pela multiculturalidade; as questões da imigração e da inclusãosocial; a luta contra a pobreza; as campanhas de educação para a saúde e as de sensibilização ambiental; a questão da responsabilidade social empresarial, do consumo sustentável e do comércio justo; e a responsabilidade social dos média.

Definição do «Consenso Europeu sobre Educação para o desenvolvimento» (2007):
A educação e a sensibilização para o desenvolvimento contribuem para a erradicação da pobreza e para a promoção do desenvolvimento sustentável através de abordagens eatividades educativas e de sensibilização da opinião pública baseadas nos valores dos direitos humanos, da responsabilidade social, da igualdade de género e num sentimento de pertença a um só mundo, em ideias e perceções das disparidades entre as condições de vida dos seres humanos e dos esforços necessários para ultrapassar essas disparidades, bem como na participação em ações democráticas que influenciam as situações sociais, económicas, políticas ou ambientais que afetam a pobreza e o desenvolvimento sustentável [...], têm por objetivo permitir que todos os cidadãos da Europa disponham em permanência de oportunidades de sensibilização e de compreensão dos problemas relacionados com o desenvolvimento global, bem como da sua pertinência local e pessoal, e possam exercer os seus direitos e assumir as suas responsabilidades enquanto cidadãos de um mundo interdependente e em mutação, influenciando a evolução para um mundo justo e sustentável.

De modo a garantir a clareza conceptual e a coerência das ações de ED, a elaboração desta Estratégia partiu da consensualização de alguns elementos considerados fundamentais para uma definição de ED. Assim, no âmbito da presente ENED, a ED é compreendida como um processo de aprendizagem ao longo da vida, comprometido com a formação integral das pessoas, o desenvolvimento do pensamento crítico e eticamente informado, e com a participação cidadã. Este processo tem como objetivo último a transformação social no sentido da prevençãoe do combate às desigual dades sociais, nomeadamente às desigualdades entre mulheres e homens, do combate à discriminação, da promoção do bem-estar nas suas múltiplas dimensões, da inclusão, da interculturalidade, da justiça social, da sustentabilidade, da solidariedade e da paz, tanto ao nível local como ao nível global. No período de vigência da presente Estratégia, este processo de aprendizagem é diretamente influenciado pela «Agenda 2030» e pelos ODS que dela emanam.

A ED centra-se na problematização de questões relacionadas com o desenvolvimento (conceitos, modelos, políticas e práticas), incluindo a problematização dos conceitos dedesenvolvimento e de educação, coloca em evidência as relações de interdependência no contexto internacional e aborda especificamente as relações de poder e o seu impacto em termos de assimetrias socioeconómicas globais, nacionais e locais. Esta problematização assenta ainda numa constante e interdependente reinterpretação das realidades, designações e abordagens referentes ao «Norte» e «Sul» globais e às relações internacionais. As expressões «Norte global» e «Sul global» pretendem representar as relações de assimetriade poder e de riqueza à escala global, sem acantonar riqueza e pobreza em coordenadas geográficas exclusivas, reconhecendo assim que há nortes no Sul e suis no Norte.

A ED procura assim promover a tomada de consciência e a mobilização dos cidadãos e das cidadãs através de abordagens educativas e de temas transversais às questões do desenvolvimento, como a proteção dos direitos humanos, a promoção de uma cultura de paz e de democracia, a promoção da justiça social, a defesa da sustentabilidade ambiental, económica e social, bem como a promoção da interculturalidade, da não discriminação e da igualdade de género, tendo em vista uma maior consciencialização sobre a importância destas questões para o bem -estar de todos e de todas e como condição para um desenvolvimento sustentável (ver Figura 2.1).

Figura 2.1 - Educação para o Desenvolvimento: conceito e objetivo

Embora a ED partilhe dimensões temáticas, assim como éticas e metodológicas, com outras abordagens educativas, é essencial destacar alguns elementos centrais e específicos na construção da sua identidade. Estes residem essencialmente na questão temática geral - problemáticas relacionadas com o desenvolvimento - e no foco geopolítico específico - Sul e Norte globais (ENED 2010-2016: 21). Historicamente, a ED tem como preocupação central a consciencialização sobre e a mobilização para a alteração das condições estruturais geradoras de pobreza, exclusão e desigualdades sociais, as quais afetam, com particular severidade, as populações do Sul global, no quadro das relações Norte-Sul. A própria reflexão em torno das categorias «Norte» e «Sul», vistas de forma cada vez mais fluida e complexa, é também ela matéria de ED.

No que diz respeito aos elementos metodológicos, no contexto da ED, a forma também é conteúdo e as pessoas são protagonistas ativas dos processos de aprendizagem. Neste sentido, a ED inclui:

  • A promoção de pensamento crítico e eticamente comprometido;
  • A promoção constante da desconstrução de estereótipos e da defesa da não discriminação, da igualdade e da dignidade de todos e de todas, independentemente da ascendência, sexo, origem racial e étnica, cor, língua, território de origem, nacionalidade, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual (razões em conformidade com o artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa e com a Lei n.º 93/2017, de 23 de agosto;
  • A promoção de processos de aprendizagem participativos, colaborativos e horizontais, direcionados para o desenvolvimento da autonomia e da responsabilização na aprendizagem e na ação;
  • A promoção de aprendizagens que interliguem, de forma complexa e não linear, diferentes saberes e níveis de análise (locais, transnacionais e globais; individuais e coletivos) e que promovam abordagens interculturais.

Todos estes elementos são constituintes de uma definição de ED de forma conjugada e não de forma isolada. A ED está ainda comprometida no seu quadro de atuação com princípios éticos de ação que constituem um elemento intrínseco tanto para a sua definição como para as iniciativas desenvolvidas neste domínio. A ED não deve ser confundida com outros tipos de ação, como projetos de cooperação na área da educação (infraestruturas, ensino, formação), como a recolha de fundos para OSC e/ou projetos de desenvolvimento, como a informação institucional sobre atividades e atores de desenvolvimento

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