Estratégia 2010-2015
A adopção de uma Estratégia Nacional de Educação para o Desenvolvimento (ENED) constitui um desafio de grande importância para Portugal. Desde logo, porque esse é um repto com que a sociedade portuguesa está crescentemente confrontada, no quadro de uma globalização que “desterritorializa” a cidadania e os seus pressupostos.
Com efeito, a noção tradicional de cidadania partia de fronteiras nítidas de inclusão/exclusão, coincidentes com os vínculos de pertença a uma comunidade nacional. Esse conceito clássico tem vindo a ser progressivamente desafiado por dinâmicas diversas, desde os fluxos migratórios até à globalização dosmercados, passando pelas novas espacialidades de referência dosmovimentos sociais. O quadro de significação dos direitos e das responsabilidades individuais e colectivas, quer em termos jurídicos, quer em termos ético-políticos, é cada vez mais o de uma interacção complexa entre o planetano seu todo e o local que habitamos ou em que agimos. É nesse colapso de escalas de pensamento e acção que hoje ganha sentido a assunção de responsabilidades directas de cada um e cada uma e de cada grupo pela governação comimpactos globais. Desde logo, porque essa interacção entre o local e o global nos faz agentes (e não só espectadores e espectadoras passivos), quer das proximidades quer das assimetrias entre Norte global e Sul global,1 o que se tornou em elemento essencial da condição cidadã no nosso tempo.
Neste contexto, além de facilitar uma efectiva apropriação, pelos cidadãos e cidadãs, das políticas dedesenvolvimento com base num conhecimento crítico das problemáticas nelas envolvidas, uma Estratégia Nacional de Educação para o Desenvolvimento deve ser assumida como instrumento essencial para permitir a prazo o acesso universal e de qualidade à Educação para o Desenvolvimento (ED) e, assim, contribuir para a consolidação do compromisso de todas as pessoas com a resposta necessária às desigualdades e injustiças que se apresentam ao nível local e global.
Ao assumi-lo com clareza na presente Estratégia, dá-se, desde logo, seguimento aos compromissos assumidos por Portugal emdiferentes processos internacionais de promoção da ED, designadamente no âmbito do Conselho da Europa, da União Europeia e do Comité de Ajuda ao Desenvolvimento da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (CAD/OCDE).
A essa motivação adiciona-se a necessidade crescente de dar um enquadramento político sólido, num clima de diálogo interinstitucional, ao muito que vem sendo feito em Portugal, de há muitos anos a esta parte, neste domínio, em grande parte por organizações da sociedade civil (OSC), procurando criar um quadro de referência conceptual e político claro e fazendo das organizações da sociedade civil e instituições públicas, desde o primeiro momento, parceiras do exercício de elaboração e implementação da Estratégia. Nesse sentido, a presente Estratégia Nacional de ED procura ser fundamentalmente uma resposta organizada a desafios fundamentais que aquela prática foi suscitando:
Desenvolvimento de mecanismos que permitam a apropriação real da ED pelos cidadãos e cidadãs.
Integração das perspectivas do Sul global nos processos de ED, contribuindo dessa forma para combater o esvaziamento do seu cunho político forte e interventivo, e conjugação da necessidade de amplitude e abertura conceptual com a fidelidade aos objectivos últimos da ED.
Conciliação clara e permanente entremetodologia e conteúdos da ED, deslegitimando práticas contrárias aos objectivos e valores assumidos como nucleares em ED.
Integração de diferentes quadros de avaliação de execução e impacto, superando o défice de avaliação das iniciativas de ED em Portugal.
Animado por estas diferentes motivações, o presente documento visa fixar os parâmetros essenciais da ENED, nomeadamente os seus objectivos e medidas de intervenção. Trata-se de uma estratégia para cinco anos, durante os quais serão envidados esforços para aprofundar o que é feito em Portugal em matéria de ED. Esta calendarização e o imperativo de efectividade prática que lhe subjaz determinam que a afirmação plena da Estratégia não se esgote no presente documento. Com base nos princípios e opções estratégicas aqui adoptados, será aprovado até ao final de Novembro de 2009 um Plano de Acção, que faz parte integrante da ENED, para concretização dos princípios, objectivos emedidas aqui condensados, e cuja elaboração seguirá – tendo em vista a sua democraticidade e a apropriação do seu conteúdo – a mesma metodologia participativa.
1- As expressões “Norte global” e “Sul global” pretendem representar as relações de assimetria de poder e riqueza em escala global, sem acantonar riqueza e pobreza (ou desenvolvimento e subdesenvolvimento) emcoordenadas geográficas exclusivas, reconhecendo assim que há nortes no Sul e suis no Norte.