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Estratégia 2010-2015

A ED é um tipo de aprendizagem emancipatório e de dialógico baseado numa pedagogia de humanismo crítico. Uma das suas assunções básicas (…) é a de que os grandes problemas da pobreza, exclusão, dominação, subjugação (…) desigualdades sociais (…) não podem ser resolvidos através das abordagens dominantes tradicionais na educação uma vez que estas sofrem de um viés urbano, elitista e corporativista.54

Esta Estratégia procura alimentar o desenvolvimento de um quadro de referência e de acções de qualidade em ED, acessíveis ao maior número possível de cidadãos e cidadãs. Por isso, as acções de ED devem estar comprometidas com a transformação social e o aprofundamento da cidadania global. O que define, à partida, a qualidade destas intervenções são os princípios fundamentais pelos quais se regem e a coerência entre ambos.

Em primeiro lugar, há que reflectir sobre a direcção dessa transformação social pretendida. Esta vai no sentido de atingir mais justiça social e mais equidade entre pessoas, entre povos, entre regiões e países. Este é um princípio básico. A ED não pode promover ou reproduzir as injustiças, as desigualdades, a iniquidade. Pelo contrário: existe para as combater. A ED não se coaduna com a discriminação aberta ou velada com base em estereótipos, pelo contrário, procura desconstruí-los, sejam eles baseados no género, na cor da pele, na classe social ou na identidade nacional/local, apenas para nomear alguns. E estas preocupações devem ter lugar tanto em contextos do Sul como do Norte.

Em segundo lugar, os princípios de acção baseiam-se na solidariedade, na cooperação e na co-responsabilidade. São valores constitutivos e indispensáveis e não podem ser usados de forma instrumental, sob risco de deturparem o sentido da transformação pessoal e social que implica a promoção de uma cidadania participativa e reflexiva, em que cada pessoa e colectividade pode ser agente de mudança.

O sentido da participação como princípio não se esgota na sua apreciação como um processo positivo em si. Afirma-se, sim, como condição indispensável para que todos e todas tenham as mesmas oportunidades de adquirirem direitos e deveres e de se constituírem sujeitos da sua própria história. Por isso, também, a participação de indivíduos, organizações, países do Sul na reflexão e na acção em ED é fundamental, de forma a contrariar todo e qualquer paternalismo que possa existir nas relações entre o mundo mais rico e o mundo pobre. Esta participação deve ser assegurada no sentido da garantia do pluralismo e da autonomia dos discursos e da possibilidade de cada pessoa se definir a si mesma e ao seu discurso e não ser heterodefinida à partida.

Neste sentido, as acções de ED não podem senão ser acções em que a coerência é um princípio central. A ED como “temática” ou “conhecimento” e a ED como atitude e abordagem integrada de princípios, metodologia e resposta concreta a problemas aos quais pretende fazer face não podem ser universos com lógicas diferentes. Dizer-se justa, equitativa, participativa, cooperativa, solidária não chega, é preciso “fazer-se” dessas formas. Por isso, na ED “a forma é conteúdo (…) as próprias metodologias utilizadas são, ao mesmo tempo, conteúdos formativos”55. Ao mesmo tempo, a ED não pode desvincular-se da análise e da crítica aos múltiplos conceitos e práticas do desenvolvimento. Os modelos de desenvolvimento defendidos devem estar de acordo com as visões e as práticas de ED no sentido da justiça social e da equidade.

Princípios que norteiam a ENED
  • Equidade: significa a aplicação operacional dos princípios de igualdade e de justiça a casos concretos, promovendo o acesso aos direitos em igualdade de condições para todas as pessoas e comunidades em função das suas necessidades e dificuldades.

  • Justiça social: baseia-se no reconhecimento de que diferentes níveis de poder significam diferentes níveis de acesso a recursos e capacidades de participação e decisão e, consequentemente, impedem a realização da plenitude dos direitos humanos consagrados. A educação deve contribuir para reequilibrar as relações de poder injustas. Implica combater a discriminação.

  • Cooperação: significa reunir esforços para levar a cabo uma tarefa na qual cada participante dá o seu contributo para um fim conjunto previamente consensualizado, segundo uma lógica oposta à competição.

  • Solidariedade: é uma atitude consciente de alguém (individual ou colectivo) que se sente participante e afectado ou afectada por um problema ou situações injustas enfrentados por outras sociedades, organizações ou pessoas. Implica a intenção de com elas partilhar as dificuldades e encontrar respostas possíveis, contrariando a indiferença.

  • Co-responsabilidade: baseia-se na noção de que Norte e Sul, centro e periferia, em escala global ou dentro de cada sociedade, têm responsabilidades comuns ainda que diferenciadas. Essa partilha de responsabilidades face aos problemas e à procura de soluções afasta qualquer entendimento de que apenas uma das partes temobrigações demudança.

  • Participação: significa que diferentes sectores da sociedade, incluindo os mais marginalizados e desfavorecidos, influenciam os processos de tomada de decisões, nos diferentes níveis, sendo assim actores do seu próprio desenvolvimento, por oposição a processos directivos ou estritamente representativos. Exige mobilização e cidadania activa, liberdade de expressão e de decisão e influência sobre opções que determinam a vida colectiva.

  • Coerência: significa que deve existir uma conformidade entre os meios e os fins, entre metodologia/forma e conteúdo, entre o que se entende por educação e o que se entende por desenvolvimento.

Fontes:
“Glossário da Cooperação”, disponível em http://www.dgeep.mtss.gov.pt/cooperacao/glossario.pdf
Argibay, M., Celorio, G., Celorio, J. (1997), “Educación para el Desarrollo. El espacio olvidado de la cooperación”, Cuadernos de Trabajo de HEGOA, 19, p. 26



54 - Kumar, A. (2008), “Development Education and Dialogical Learning in the 21st Century”, International Journal of Development Education and Global Learning, 1(1), p. 41.
55 - CIDAC (2004), “Educação para o Desenvolvimento – Ficha Formativa n.º4”, Plataforma Portuguesa das ONGD, Abril.

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